terça-feira, 19 de março de 2013

Uma declaração de amor sem fins lucrativos.


Cheguei vazia como se tivessem arrancado meu coração de mim ontem à noite. O corpo estava tão relaxado que eu podia jurar que me injetaram qualquer droga. Só que não. Era só um estado de paz que eu não sentia há muito tempo. E quando não se tem paz há muito tempo e depois se toca nela outra vez, é meio como estar dopado. Eu até tinha fome, mas pensava: Posso passar sem essa, a vontade de ficar aqui em silêncio é tão grande, tão intensa. Eu ficaria estática daquele jeito por horas. E então comecei a olhar umas fotos – algumas recentes e outras de dez anos atrás.
E meu espírito novamente se encheu de paz. Porque eu entendi algumas coisas que tinham ficado nubladas por anos. Eu estava ali, deitada em minha cama, olhando para um sorriso que por anos foi a razão da minha insônia e não havia lágrimas. Eu fiquei imaginando o quanto isso me fez falta, e quão abençoada sou, porque alguém lá do andar de cima resolveu me dar mais uma chance. E ontem de manhã, com o dia começando, enquanto ia até a padaria, eu disse “Todos nós merecemos uma segunda chance... a vida às vezes não nos dá essa oportunidade, mas quando dá, também cabe a nós tomar a decisão certa – a decisão de aproveitá-la”.
Muita sabedoria para uma manhã qualquer.
Mas quando algo está para acontecer – ainda que seja apenas uma grande verdade a ser revelada, acredito que nosso coração possa sentir. E de alguma forma, essa mensagem é transmitida ao cérebro e então, nossa boca nos surpreende. É uma mágica.
Ontem, por alguns minutos, pude experimentar não sentir absolutamente nada: nem dor, nem mágoa, nem tristeza. Apenas a paz de um coração desprovido de qualquer dúvida.
Só então me fiz a seguinte pergunta: quanto tempo temos? E o que estou fazendo com esse tempo que me foi dado? Este brinde, esta segunda chance, tão rara. Tenho o direito de ficar confusa, eu sei. Tenho o direito ao grito, se isso ajudar. Tenho o direito de sair correndo quando me sentir assustada. Tenho o direito de fechar os olhos se por acaso a imagem diante de mim não me fizer sentir bem. Conheço os meus direitos e faço uso deles. Mas dos direitos que possuo, o de voltar é o mais valioso. Ter o direito de voltar.
E eu voltei, desengonçada como só eu. Mas voltei.
No caminho de volta, passei por todos os lugares que havia deixado para trás. Tranquei portas: essas, eu não pretendo abrir mais. Apenas observei de longe uma última vez. E continuei meu caminho, chegando ao destino: uma casinha pequena, bem simples, ainda inacabada. A mocinha veio me receber com rosas – lindas e perfumadas. Foi ela quem contou sobre a dádiva da segunda chance. Pediu-me para aproveitar esse presente. Ele é meu. Algumas coisas ficaram inacabadas em minha vida, mas este presente não ficará. O que eu tenho que fazer? Como aproveitá-lo?
Ame.
Apenas ame. Cuide com carinho. O presente é seu, porém, por tempo determinado. Tem prazo de validade. Aproveite e dê o seu melhor agora. Hoje. Nesta noite. Seu presente não deve lhe machucar, e nem você a ele. Portanto, daqui pra frente, só o melhor. Fique com o lado bom. Não tem que ser um fardo carregá-lo. Carregue-o em você com alegria, pois logo será apenas uma lembrança. Que a lembrança seja boa.
Esse já era o fim da linha. Com um abraço forte nos despedimos e eu fui para casa. Sem lágrimas. Sem dor alguma. Em paz.
Esqueci a resposta para quanto tempo temos. Que seja a menor das minhas preocupações. Só quero dedicar parte do meu pensamento, parte do meu coração a esse incrível presente. Quero que ele saiba que meu amor não tem nome, cor, tamanho e não pede absolutamente nada. Meu amor é pura gratidão, a quem o tenha me dado e ao próprio presente em si, porque em seu momento de livre-arbítrio, escolheu se voltar a mim.
Ao meu presente, fica aqui minha declaração de amor sem fins lucrativos: você tem meu amor, minha lealdade, minha amizade, meu pensamento e parte de meu espírito, onde quer que vá, em qualquer tempo.