terça-feira, 26 de agosto de 2014

As qualidades que tornam pessoas inesquecíveis


Embora apenas uma ou outra seja realmente memorável. Pessoas inesquecíveis possuem qualidades que nem sempre estão à vista. Mas se mostram nos momentos em que se fazem realmente necessárias – na mente e no coração das pessoas ao seu redor.
Elas acreditam no inacreditável, enquanto a maioria tenta alcançar o alcançável, por isso a maior parte das metas e objetivos são somente incrementais, e não inconcebíveis.
Pessoas memoráveis esperam mais – delas e dos outros. E elas te mostram como chegar lá. E te trazem junto para o que parecia ser uma jornada inacreditável.
Essas pessoas enxergam oportunidade na instabilidade e na incerteza.
Problemas inesperados, obstáculos imprevisíveis, grandes crises. A maioria se recolhe ao momento de derrota e espera a tempestade passar.
Alguns poucos enxergam a oportunidade na crise. Sabem que é muito difícil tomar grandes decisões, mesmo as necessárias, quando as coisas estão relativamente fáceis. Podem reorganizar um ambiente de forma a torná-lo novo.
Carregam suas emoções em suas mangas. São profissionais em separar o emocional do racional, e, ainda assim, são abertamente humanos. Mostram excitamento sincero quando as coisas vão bem. Mostram sincero agradecimento pelas tentativas daqueles que fazem parte de sua vida.
Também mostram sincero desapontamento – não nos outros, mas neles mesmos. Celebram, sentem empatia, se preocupam. Às vezes ficam frustrados e até irados.
Protegem os outros do trem, nunca lançam contra ele.
Pessoas memoráveis vêem o trem vindo e empurram as pessoas para trás, mesmo que essas pessoas não tenham visto o perigo iminente.
Mas não querem crédito por isso. Pessoas memoráveis lideram pela permissão, pela natural aceitação. Porque são naturalmente líderes.
Abraçam grandes propósitos.
Não são lembrados só pelas gargalhadas, mas também pelos pequenos momentos em que sua atitude fez toda a diferença, algumas vezes até entre a vida e a morte.
Elas aceitam o risco real.
Muitas pessoas tentam ficar em algum tipo de pódio superficial, uma espécie de situação confortável. Roupas confortáveis, carros, casas, pequenos luxos. Gostam de fazer com que tudo isso apareça e pareça o tipo de vida ideal para o resto das pessoas, enquanto as realmente memoráveis ficam de lado desejando a posição não popular. Dão passos incomuns. Aceitam o desconforto de ignorar o status quo e se arriscam em águas turbulentas.
Aceitam o risco real não pelo bem da recompensa que acreditam ser possível.
E pelo seu exemplo, inspiram outros a também se arriscarem para alcançar aquilo que acreditam ser possível.

Inspiram pessoas a acreditarem em seus sonhos, porque nunca dirão “eu desisto” – você saberá reconhecer pessoas memoráveis por suas palavras, ações e, o mais importante – pelos seus exemplos.

sexta-feira, 4 de julho de 2014

Eu fecho os olhos

Parafraseando Clarice Lispector, "não sou triste assim, é que hoje estou cansada". Incontáveis letras de músicas me vêem à cabeça enquanto monto frase após frase.
Em "Only God Knows Why", Kid Rock disse: "eles dizem que todos os homens sangram como eu, e eu acho que esse é o preço que se paga por ser o tipo de pessoa que sou (...)".
Nossas vidas são de modo geral bem parecidas especialmente nos baixos. O que nos diferencia, talvez, seja a forma que cada um lida com seu momento ruim.
Eu não sei se tenho um padrão para esse tipo de momento. Quando vem, em geral, é de surpresa e quase sempre não estou com todas as palavras certas prontas. Às vezes sequer sei o que dizer. E em determinadas situações, preferi simplesmente fechar os olhos para poder suportar. Como quando o cérebro manda uma mensagem para todo o corpo dizendo que é hora de desligar para sobreviver. Então desmaiamos. E quando acordamos, há um sedativo pingando com o soro direto em nossa veia. Estamos deitados, sendo observados com cautela, sendo cuidados por outras mãos, que não as nossas. Tudo, tudo para que o coração consiga se restabelecer e prosseguir por mais alguns anos. 
Fechar os olhos, mesmo sabendo que ao abri-los, o pesadelo ainda estará lá, fez com que eu suportasse quando não havia mais um pingo de energia ou número de telefone para o qual pudesse ligar. 
Foi apenas um "modo de segurança". Solitário, errôneo, criado involuntariamente por mim, e trabalhei com o mínimo das funções para poder fazer uma reinicialização que não causasse danos.
Mas há efeitos colaterais para tudo. Qualquer tratamento com qualquer tipo de remédio tem seu preço. Pode custar a saúde do fígado, dos rins, do cérebro... Há sempre um preço.
Quanto custa hoje o meu fechar de olhos? Mais do que há em minha conta. Mais do que há em meus músculos, nervos, ossos, mais do que há em cada célula do meu corpo.
E desistir não é uma opção. Só posso fechar os olhos temporariamente, porque preciso do dia seguinte. Preciso de mais uma manhã, porque ainda não acabou. Preciso de alguns anos e, acima de tudo, preciso acreditar que faz sentido operar desta maneira.
Porque ainda não encontrei outra forma de sobreviver. A única coisa que me fez sair correndo com lágrimas nos olhos - sempre - foi ela. 
A única razão. A única missão. E eu falho mais do que acerto. Mas não desisto. Quanto está doendo agora?
Tanto quanto se pode suportar ou talvez um pouco mais.
Mas não sou triste, nem uma perdedora. Não sou fraca, nem indecisa.
Não sou de aço, mas não abro mão sem lutar até não me restar mais nada. E quando não houver mais nada, fecharei novamente os olhos e esperarei até a pior parte passar. E que Deus me ajude. Que eu tenha a chance de acordar medicada, sedada, que eu tenha a chance de continuar. 
Quero não perder a fé em minha capacidade de sobrevivência. Quero não perder a fé em minha capacidade de ensinar. De educar. De ser lembrada não apenas pelas dores que possa ter causado, pelas cicatrizes que tenha deixado, mas também por todo amor que tentei dar. Não sou triste assim... É que hoje estou cansada.

~~
ASM

segunda-feira, 9 de junho de 2014

Roda gigante

Estava viajando. Já havia passado pelo que posso chamar de maior terror do mundo – doze intermináveis horas dentro de um avião cercada de estranhos que não falavam o meu idioma.
Às vezes eu entendia o que o comandante falava quando passava do francês ao inglês, mas ainda assim, era agonizante.
Então, enquanto a agonia consumia todo o meu apetite e fazia o álcool das garrafinhas de vinho que tomei sem hesitar evaporarem de alguma forma dentro de mim, eu pensava no preço que tinha que pagar para realizar um dos grandes sonhos que nutri, apesar de toda a bagunça que tinha sido minha vida na altura dos vinte e cinco anos.
Imaginava o quanto aquelas pessoas chiques haviam se preparado para finalmente descerem lindas e ricas do avião – deviam ter dinheiro pra caramba. Eu, coitada! Emprestei casacos, calças de inverno, toucas, botas, emprestei quase tudo.
Levei algumas centenas de euros, um cartão de crédito e a fé de que ainda que eu tivesse que trocar o almoço pela janta, faria isso na cidade luz. Eu trocaria o almoço pelo jantar em Paris.
Nunca fomos de família rica. Eu não podia e nem tinha dinheiro pra gastar. Mas havia algo que eu sabia fazer muito bem: sentar, observar e escrever.
Era uma noite gelada e úmida. Estava a alguns degraus de tocar a água congelante do Rio Sena com uma bolsa imensa repleta de toda sorte de utensílios.
Peguei um caderninho que havia comprado no aeroporto e vasculhei até encontrar a caneta que me fizera companhia durante a viagem de ida.
Ao longe, via a roda gigante toda iluminada. Ela era a personificação do romantismo. Não sei dizer se as pessoas que formavam aquela fila imensa para um passeio de uma volta lenta naquele objeto estavam em busca de fortes emoções ou apenas queriam ser tomadas pela emoção de viver um momento de extremo romantismo. Se fossem amigos, provavelmente se lembrariam daquela noite com poemas, frases de autores famosos escritas sobre as fotos tiradas nas diversas alturas da roda gigante. Essas pessoas tinham tanta sorte com seus sorrisos imensos. Foi quando me dei conta de que estive durante muito tempo sozinha demais para pensar em amor, mas precisava, ainda que inconscientemente, acreditar que tudo isso passaria. Como meu medo de voar. De não dar conta do recado, de não saber o que fazer quando algo der errado. Eu estou em minha própria montanha russa. Claro!
Voei de volta, depois voei outras vezes e prometi que nunca deixaria de fazer mais nada por medo. Eu certamente cederia às tentações com mais freqüência e o único detalhe que permaneceria como estava era o meu coração no que dizia respeito a deixar outro homem entrar. Até que a hora certa, se é que existe isso, chegasse.
Quando estou no banco do passageiro com as mãos suadas, vendo o velocímetro marcar uma velocidade bem maior que a permitida, fecho os olhos e penso: estou alta o suficiente para morrer sem sentir pena de não viver mais? Porque amo tanto a vida!
Quero a loucura que me permita inspirar e expirar sem cessar. Quero ter a coragem dos pára-quedistas. Mas quero viver também. E talvez, a grande sacada da vida seja justamente o fato de que o meu prazo de validade aqui é contado e a única coisa que meu medo fará por mim é eliminar duas ou três grandes oportunidades de sentir a adrenalina consumindo cada célula do meu corpo. Seriamente, eu preciso pensar com mais carinho e afinco a esse respeito.
Troquei a cerveja pela vodca e descobri que prefiro vodca com guaraná. E três pedras de gelo.
Fico alta por prazer. Porque quero ficar bem alta. Senão tomaria só o guaraná.

Aquelas pessoas felizes da roda gigante de repente não são de modo algum mais felizes do que eu com minha vida simples. Há esse cara que me aguarda do lado de fora com óculos escuros e pose de bad boy. E eu amo vê-lo ali quando encerro meu expediente. Porque então começa outra parte do meu dia – a que eu sei que será, de verdade, uma roda gigante. E eu vou rir, chorar, gritar, silenciar, fotografar, postar, comentar. Farei tudo que sentir vontade, porque sei que serei tomada por todo tipo de emoções. Com doses ordinárias de vodca. Desculpem. Eu não sei mais como é pedir desculpa por abrir o coração.

sexta-feira, 6 de junho de 2014

Um brinde à nossa coragem.

Às vezes é difícil ver a mudança de onde você está. Aquela semana de dezembro se transformou em junho, e assim, sem que você pudesse se dar conta, sua vida mudou.
Agora não são mais duas pessoas.
Eu poderia estar falando de mim, mas não hoje. Vi com uma satisfação incontestável a vida de pessoas queridas mudando silenciosamente de forma a torná-las aprendizes do companheirismo. Há que se ter um coração de pedra para não permitir que aquela lágrima verta - uma tradução e possivelmente a única - daquilo que também transborda em meu coração.
Tocamos com dedos de fada e das formas mais inusitadas os corações das pessoas. E elas nos tocam da mesma forma. De modo a completar um mundo que por tantos anos pareceu equivocadamente feliz. 
É uma guerra constante entre o próprio desejo de liberdade ainda latente e esse novo universo onde tudo é contado aos pares. E segue se multiplicando, porque uma pessoa nunca chega só em nossa vida.
Ela traz suas histórias, sua própria lenda pessoal, seus sonhos destruídos, ela chega com uma bagagem que, assim como a sua, pode ser também uma caixa de pandora.
Então cabe aos seus dois lados decidir qual parte desta vida vale mais a pena: a união de dois mundos diferentes que se complementarão e trarão a força da muralha da China, ou a já tão batida vida de ceder às rotinas de todo o check list de cada dia de sua semana, que foi como a semana passada, o mês e até mesmo os anos passados.
Houve tentativas frustradas na vida de todos nós e não há como apagar, mesmo que esse desejo arda em nós.
Mas agora, veja... Há uma porta imensa aberta com paisagens nunca antes vistas. Rostos infantis tão cheios de amor que emocionam pela simples existência. Vozes e passos que te lembram o tempo todo que o lugar que antes fora tão vazio, agora tem seus cômodos ocupados, bagunçados, cheios de um novo ar - um ar puro e fresco que emana desse tipo de felicidade que só pessoas como eu e você - com coragem para dar o próximo passo em direção ao desconhecido - terão a chance de conhecer e viver.
Ao ser de força incomparavelmente maior que a minha, o meu muito obrigada.
Agradeço por cada amiga e amigo, por cada ente, por cada vida que soube enxergar que era o momento de ser feliz e abraçou - com ou sem medo, o fantástico prazer de compartilhar sorrisos, lágrimas, problemas, soluções, derrotas, vitórias, novas vidas, e tudo mais que faz essa escolha ser tão digna de nós.

quarta-feira, 4 de junho de 2014

O bom e o excelente

Lembro todos os dias quando o despertador me acorda às 5h30m da manhã que sou e sempre fui mãe solteira, apesar de um dia ter sido casada. Lembro que odeio esse rótulo.
E lembro que infelizmente não foi possível desempenhar bem dois papeis ao mesmo tempo – meu chefe costuma dizer: “Tem o excelente e tem o bom... Se não puder ser excelente, que seja bom. Já é um começo.”
Odiei ouvir isso nos primeiros meses. Achava, além de deselegante, absurdamente desmotivador. Mas o fato é que eu não tenho sido excelente.
Com muito esforço, sou boa.
Então ele talvez tenha razão. Eu quis ao menos ser boa mãe, e fazer as vezes de pai, quando a situação pedia. Só que eu não sei o que o pai faz.
Pai provê o sustento? Ok, eu faço.
Pai vai às reuniões escolares? Eu não sei. Alguns vão. E sempre que vejo um pai sentado na carteira do filho, sinto vontade de chorar.
Sinto vontade de morrer.
E um pedacinho do meu coração se acaba ali mesmo, diante do professor e daquele quadro verde velho.
Pai leva ao hospital. Sim, outro dia, eu e minha mãe aguardávamos meu atendimento no pronto socorro e eu vi um pai com sua filhinha de uns dois anos, a menina não parava quieta e enquanto ele corria atrás dela, contava pra nós (todos que estávamos sentados ali) sobre as travessuras dela com um sutil toque de orgulho, tipo “minha filha já faz tudo isso e nem tem dois anos ainda, sabem?”
Eu lembro que meu pai me fazia ajoelhar de manhã para a oração do Pai Nosso. E depois ele rodava a gente, enquanto cantava “hoje é domingo, pede cachimbo...”
Depois era hora de ir pra igreja – e eu só gostava mesmo porque era domingo, e domingo tinha macarrão, maionese e frango frito com coca-cola em casa. Era só esperar o culto terminar.
Não dei nada disso pra minha filha.
Eu não a poupei da ausência feroz de um pai – não porque ela não tenha um, pois tem. Mas, porque escolhi mal. Ou simplesmente não escolhi.
E lá se vai outro pedaço do meu coração.
Não tendo o pai para prover o sustento, levar ao hospital, ir às reuniões escolares, tudo isso coube a mim. Mas eu ainda precisava ser mãe.
Não teve jeito. Não alcancei a excelência. E sei que só serei lembrada como uma pseudo heroína quando daqui a cinqüenta anos, minha filha estiver contando pros netos dela sobre como a mãe dela deu duro para conseguir fazer as coisas acontecerem.
Fora isso, sou só mais uma mulher que faz o que milhões de mulheres fazem: dão o que têm pra dar. Tiram um rim, um pedaço do fígado, a retina, uma mão ou duas, um pé, uma perna, se precisar, tiram o próprio coração.
Não sei o que queremos dessa vida. Eu hoje, sendo bastante sincera, só queria ter a chance de cair num silêncio tão profundo quanto o Titanic no oceano.
Meu olhar deu aquela implorada por um abraço nas primeiras horas do dia. Mas olhos não falam direito o que a gente quer dizer, então digamos que eu tenha sido mal interpretada e soou como se eu fosse a criatura mais dramática do universo. Talvez eu seja.
Quando você não tem força pra espancar alguém, você grita. Ou chora.
Eu faço os dois.
E depois limpo os borrões de maquiagem, viro uma xícara de café e retoco o batom.
A vida pede... Não, acho que a vida exige. Porque ninguém dispõe de tempo hábil para tantas lamentações.
De qualquer forma, se tudo mais falhar, eu terei sido uma “boa” mãe... Uma dona de casa nota cinco, o que me faria passar de ano. Ou, no máximo, me deixaria de recuperação, mas aí eu capricharia mais. Sei lá. Se precisar, eu faço.


quarta-feira, 28 de maio de 2014

Medo de voar

Olhando a foto que tirei de dentro do avião enquanto ia da Áustria para a França em 2012, percebi que tenho medo das coisas que mais amo. Sempre achei aeronaves lindas, leio muito sobre elas, sei dizer o nome do fabricante olhando o nariz do avião ou suas asas. Conheço a linguagem. Amo as aeronaves, desde um teco-teco, A380, Beluga ou Antonov. Amo essas máquinas, mas morro de medo delas.
Não consigo me ver viajando como meus colegas de trabalho fazem. Pra eles, é tudo muito normal, é só entrar, sentar e relaxar.
Eu entro tremendo, sento chorando e fico com o nariz literalmente colado na janela do avião, observando cada movimento, gritando involuntariamente cada vez que o avião precisa fazer uma curva e sua asa se inclina para além do meu campo de visão das montanhas abaixo das nuvens. Deixo o copo cheio de água para tentar captar as turbulências mínimas. E quando saio do avião, sinto pena de mim por não ter aproveitado o momento em que “passeei entre as nuvens”. Continuei viva, sem um arranhão sequer, mas só me permiti sofrer enquanto meu corpo inerte viajava a setecentos quilômetros por hora, a onze quilômetros de altura. Toda vez que coloco os pés no chão depois de voar, tenho essa mesma sensação.
Mas nunca havia parado para pensar a respeito. Na verdade, esse medo não é somente de voar.
Sonho que estou voando às vezes. Aprendi que mesmo que eu caia, não vou morrer, então nunca sinto medo. Já vi aviões caindo em sonhos inúmeras vezes. Vi tanta gente morta, machucada... Vi tanta explosão. Exceto quando eu estava também a bordo.
Então, entendi que o medo é na verdade de todas as coisas que eu não posso controlar.
O homem ao meu lado na cama é o cara por quem sou apaixonada. Ele tem os olhos cheios de paixão e toca meu rosto suavemente enquanto me pede para confiar em suas palavras.
“Eu te amo muito”
Sou irrevogavelmente apaixonada pela sua pele, cheiro, textura, sabor, calor... E acho que ele é meu avião. Sinto medo por não poder controlar absolutamente nada. Não sei quem está no comando – sei que não sou eu.
Ele corre na estrada e eu me agarro à bolsa, ao cinto de segurança, fico imóvel, sinto as mãos suando a ponto de pingar. E novamente, olha na minha direção e diz: “confie em mim”.
Sou um muro de concreto e aço quando se trata dos meus medos, porque abandoná-los significa abrir mão de estar segura. Só que vivo tentando espiar o mundo do outro lado.
Encaro tanta coisa com braveza... É uma pena que eu sinta medo justo daquelas que mais amo.
Os aviões deveriam me amar incondicionalmente. E deveriam ser pilotados só por mim. Assim eu estaria no controle. Eles não cairiam. Eu não cairia. E a paisagem seria sempre de tirar o fôlego – só que sem o susto.
Se o mundo fosse meu e eu tivesse esse poder, as coisas seriam assim.
Por enquanto, só posso desejar que minha respiração não falhe, e que o meu amor consiga perdoar tanto medo. Eu não quero cair. Eu quero apenas voar.
~~
AM




segunda-feira, 19 de maio de 2014

Nós, mães, somos LOUCAS.

Hoje, por uma necessidade pessoal absoluta, pausei minhas atividades para escrever breves linhas acerca de um assunto que venho tentando dominar nos últimos dezesseis anos: a maternidade. Ocorreu-me que não existem mães normais. Somos todas loucas. Nenhuma outra criatura na terra é capaz de suportar tantas intempéries, tanto sufoco, sofrimento, abandono de si, solidão, muitas vezes até fome – tudo, tudo para garantir que aquela pessoinha que foi gerada dentro de nós tenha o que precisa para viver e ser feliz. Vejo-me no espelho com aquelas marcas de cansaço no rosto, as linhas abaixo dos olhos que agora já não voltam mais como antes após as primeiras horas do dia... Tudo mudou. Ser mãe de um bebê é cansativo, corrido, dá trabalho, mas neste estágio, ele depende inteiramente de nós e isso nos faz sentir verdadeiras guerreiras. Um bebê faz da mãe a criatura mais poderosa e mágica do mundo. Só que filhos crescem. E nós temos que crescer e amadurecer com eles, às vezes não sabemos como fazê-lo. Surtamos. Eu grito, choro, esperneio, eu tento de todas as formas segurar a minha cria pelos últimos finos fios que a prendem junto a mim. Tenho medo por ela do mundo lá fora, durmo mal e apenas algumas horas picadas, e tem noites em que aguardo olhando pro relógio, acesa, exausta, mas incapacitada de dormir – sempre esperando a princesa que eu fiz nascer chegar sã e salva.
Eu quero dizer que, se pudesse voltar no tempo, teria sido a melhor filha do mundo para minha mãe. Teria feito massagem nos pés dela todo final de dia. Teria colocado rodelas de pepino em seus olhos antes de dormir. Eu teria preparado seu café da manhã e garantiria elogios da professora apenas para vê-la se orgulhar de mim.
Verdadeiras mães corrigem, berram, dão os tapas necessários para que a vida não o faça com mais violência e sem amor algum.
Nós somos todas loucas. De amor por esses seres que às vezes nos fazem chorar, perder cabelos, perder o dia de trabalho, o sono, a fome. Somos loucas porque dependemos da felicidade deles para sobreviver.

Filhos... Amem suas mães. Amem! Amem muito. E cuidem, porque apesar de parecermos super mulheres, nós também sentamos num cantinho pra chorar. Nós morremos de medo. Nós temos que guardar nossas fraquezas na ultima gaveta do armário antes de acordá-los pela manhã com o sorriso carregado de amor. Somos frágeis. E vocês são nosso mundo. 
Mães, vocês são as maiores heroínas de qualquer tempo. De qualquer história. De qualquer fé.

sexta-feira, 11 de abril de 2014

Das coisas que eu entendo


Estou ouvindo "Das coisas que eu entendo", do Nenhum de Nós.
Para mim, essa não é apenas mais uma música linda. Ela reflete muito bem o meu constante estado de espera. Não sou a pessoa que espera de mãos atadas, eu apenas espero as coisas que estão fora do meu alcance, aquelas sobre as quais não exerço absolutamente nenhum controle, mas quero. 

"Meus dias se passavam rápido como um sonho, e você disse que eu saberia facilmente como chegar onde eu queria"

E cá estou. Onde eu queria.
E é fato: os dias se passaram muito rápido. 
O tempo voou. 
Mas durante meu estado de espera, não imaginei, nem por um segundo, que estivesse esperando, de fato.
Era só o nervosismo, mesmo. E vamos deixar assim, não pretendo manchar minhas lembranças com realidades amargas.

"Bem que eu podia ser mais bonita. Talvez mais jovem. Ou talvez nada disso fosse mesmo adiantar"

Eram momentos passageiros. Pequenas crises existenciais. Nada disso me tornou menos amável, em tempo algum. 
Sei que fiz um ou outro sofrer – sou tão santa quanto os que me lêem, sei como é não querer parecer egoísta e ao mesmo tempo não se ver em condições de abrir mão de alguma coisa, ou alguém. Tenho memória que me condena também. Mas como ninguém é obrigado a fazer prova contra si mesmo, vou pular esta parte.
Tenho uma relação de amor e ódio com a música – tanta coisa que gostaríamos de esquecer. A música sempre traz de volta. E às vezes ela evidencia meu estado de espera.
Você já deve ter conhecido alguém que fez coleção de prints. Só porque gostaria de morar num determinado momento, se possível, para sempre. Eu também não sabia que esperava pelo conto de fadas. Mas quem não espera, ainda que secretamente?
Meus recortes têm valor inestimável – eu posso não ser amada para sempre, mas tenho a lembrança do momento em que me senti tão desejada quanto a própria vida. Espero que os telefones ainda me permitam ver esses recortes bobos daqui a cinqüenta anos, se até lá minha nave não estiver de volta.
A besteira das lembranças é que elas em geral têm fundo musical. E aqui estamos novamente sendo sugados de volta para o passado (tanto faz se remoto ou não).
Não ajuda quando você tem a árdua missão de tirar alguém de sua vida.
“Nos livros, nos seus discos, vou entrar na sua roupa”
Isso é verdade!
O cheiro da pessoa fica tão impregnado em nós que parece um vírus. E onde está o antídoto? Não existe. Há situações em que apenas se aprende a conviver com a existência de um sentimento que até enfraquece, mas nunca morre.
Hoje, correndo o risco de ter sua vida plenamente invadida pelo outro, não acho tão legal olhar as páginas das redes sociais. Quero ter as minhas próprias histórias quando estiver olhando nos olhos de alguém. Não quero ler a mensagem de fulano, nem ver a foto de quando estávamos em mundos completamente distintos. Eu sou “old school”. Prefiro ouvir e desejo de coração acreditar no que chega a mim. São pessoas, e eu gosto do toque. Eu gosto da sonoridade. Odeio imagens congeladas exceto por aquelas que eu mesma recortei.
Nem todos os anos e nem todas as lágrimas me fizeram deixar de ter um coração idiota. Idiota, cego e com memória seriamente seletiva.
Um dia eu cansei. Cansei de ser a garota sexy, a arroz de festa. Cansei da alegoria. Porque depois da diversão, das noites em Vegas, eu chegava em casa e continuava só. E é quando a solidão te joga contra a parede e te derruba no cantinho do quarto que você se dá conta de que continua esperando pelo pequeno milagre que nunca vem. Ora, certas coisas não estão destinadas a nós, simplesmente. Mas eu gosto de acreditar naquilo que me soa mais agradável. Não sou obrigada a aceitar verdades frias, ou sou?
Pois bem.
Quando cansei, foi de tudo.
Foi de uma vez.
Aboli os relacionamentos – inclusive os esporádicos e “one-night-stands”.
Nos últimos anos, deixei de comparecer aos encontros. Deixei de achar justo. Lembro que da última vez, eu havia acabado de desembarcar no Brasil, e ele estava a caminho do aeroporto, voltando para a Alemanha. Pensei: “dane-se. Quero ficar longe do mundo. Dos homens.”
Então fiz questão de que este último encontro não acontecesse. E pouco importava o que ele ia pensar – eu não sei até hoje, porque nunca mais nos falamos.
Só me dei conta do tamanho do vazio quando, num esforço inimaginável, parei diante do espelho e confrontei a pessoa horrorosa do lado de lá.

"Então foi nisso que você se transformou?" 

Como culpar alguém por não me amar quando eu mesma não era capaz? Onde estava a mulher que eu costumava ser?
Eu havia me transformado numa “jovem senhora” sem graça e quase careta. Que fazia piadas no escritório, na mesa do bar, mas ia para casa sozinha. Assistia House ou Nurse Jackie com um par de comprimidos nas mãos e uma long neck na outra. Patética. Solitária. Esquisita.
Eu não era mais eu.
Não queria compartilhar as aventuras das minhas viagens pela Europa. Não queria falar sobre quão fantásticos os anos tinham sido. Eles nem tinham mais graça.

Certo dia, vi-me numa foto de trabalho, era uma feira de negócios. Diante daquela pessoa extremamente “senhora dona de casa, mãe, super responsável”, pensei honestamente em desistir de tudo. Não era eu. Aquilo era quase uma quarentona sem esperanças.
Tinha que parar o barco.
Só não havia um excelente motivo. As borboletas.
As malditas borboletas haviam me abandonado há anos. Lá, quando eu desisti de sofrer.
Meu estômago estava ocupado com gastrites, ele não tinha tempo de criar borboletas.
Até que num dia desses de absoluta correria na frente do computador, uma mensagem me alertou que fulano de tal havia comentado numa foto minha. Mas que coisa. Fiz como de costume um print da tela, porque parecia mentira.
Podia ser pegadinha. Ele devia estar fazendo uma piada de extremo mal gosto. Quem é que mexe com pessoas que estão vivendo suas vidinhas normais sem incomodar ninguém?
As pessoas não simplesmente ressurgem.
Não quando você já tomou a decisão de repelir qualquer forma de contato.
Ele devia pensar em garotas loucas, mas talvez eu não fosse tão louca. Ou fosse louca do nível sanatório. Daquelas que precisa às vezes de camisa de força.
Senti que tinha o direito à resposta e respondi. Pronto.
“Se eu pular do trem, então... Quer dizer que você me pega? Até parece. Mas não deixa de ser uma delícia pensar que isso pudesse mesmo acontecer...”
E adivinha quem lembrou que tinha coração?
De repente, eu queria ser eu outra vez.
Queria fazer justiça à minha fama de rebelde. Aos anos sendo rotulada de ovelha negra. Eu quis tudo que sempre foi meu. Não só o lado cômico. Eu quis ser a garota sexy. Só pra ouvi-lo dizer que eu era.
Dualidades a parte, neguei. Neguei e ainda nego que possa estar apaixonada.
Quanta negação idiota. E perda de tempo. A gente tem que agradecer aos momentos de pequenas felicidades porque eles nos trazem de volta. Alguma forma maior que eu me deu coragem suficiente para pensar “ou você vai até ele ou você simplesmente não merece que ele te veja de uma forma tão bonita.”
Momentos de pequena felicidade, estes pequenos milagres que esperamos sem dizer palavras não acontecem sem sofrimento. Talvez o meu pequeno milagre não esteja sequer procurando a garota sexy. Talvez ele até já tenha encontrado alguém para carregar consigo por toda a vida. Eu sei que posso ser o que eu quiser, mas sentir a própria maturidade e força de atração quando o brilho que nasce com a chegada deste pequeno milagre acontece, isso por si só já é um inestimável presente. Pode ser que ele precise de mim. Pode ser que eu precise dele.
Ainda que não façamos a menor ideia, ambos estamos recebendo ajuda.

Às vezes esperamos tanto tempo e nem temos ideia do que estamos esperando. Talvez isso seja um tipo de amor. E por que não?